quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

A mala do meu pai - Elias Salgado

Por anos eu vi aquela maletinha com ponteiras metálicas, duas tiras que a traspassavam, como dois cintos, sua estrutura dura, seu forro de tecido de leve estampado, toda de couro puro marrom. Estava sempre vazia e posta em cima do armário do quarto de meu pai, na “Casa Rosada” da Luis Antoni, em Manaus.




Como todos seus pertences pessoais - o seu mundo adulto e masculino, suas histórias não contadas - que eu remexia escondido, quando ele não estava, e que me causavam um misto de frisson e curiosidade – algo que me aproximasse do universo particular daquele homem, que deveria ser para mim um modelo, mas que me era intrigante e até mesmo distante. Um oceano parecia me separar de meu pai....

Do alto de minha adolescência eu me rebelava, questionava, e tinha medo de sua rigidez. Hoje sei o que procurava naqueles pertences, procurava diálogo, procurava compreender e ser compreendido, mas o abismo parecia intransponível e um dia eu fugi, me exilei dele, deixando para sempre aberta aquela ferida. Ao menos assim pensei por muitos anos.

Foi a morte de meu pai, o tal destino que nos transforma a todos em iguais em dado momento, que permitiu o encontro tão alentado.
Foi a sua real ausência física que me colocou na dimensão da nossa verdade.

Reunidos os sete filhos para prantear seu passamento, lá estávamos nós os “valorosos Elmaleh”, filhos do Sr. David, o “Rei de minha Macondo”, a pequena e mítica Bôca do Acre, onde tudo começou para mim.



Os filhos de David Salgado( Elmaleh), reunidos, já na ausência de seu pai, na Shivá
Da direita para a esquerda: David, Eliezer, Moisés, Jamila, Elias e Salomão
 ,
Entre a dor pela perda do pai e a emoção do nosso reencontro- a vida nos havia afastado um do outro e nos espalhado por vários e distantes cantos, anos à fio, havendo entre nós aqueles que não se viam há dezenas de anos...

Foi nesta oportunidade, quando me parecia que não tinha volta, que o que havia se quebrado jamais poderia ter conserto, que o aparentemente improvável se deu. A presença(memória?) de meu pai se fez entre nós, mais viva do que nunca. Como que num encantamento mágico real, nos reaproximou a todos outra vez.

E muito mais, com uma generosidade nunca antes vista, meu pai se mostrou para nós como ele realmente sempre foi. E nós,como se a juntar as peças de um enorme quebra cabeças, ou como quem se põe a decifrar em equipe, um texto antiqüíssimo, um hieróglifo,
nos pusemos, a escolher, dentre os objetos pessoais de meu pai, algo com o que pudéssemos satisfazer nossa perda e guardar sua memória viva através daqueles objetos.



Cada um de nós sabia qual objeto queria guardar para si e ao explicar sua razão, punha-se a relatar porque aquele objeto fora o escolhido. O incrível é que todos já sabiam a razão da escolha do outro, o seu porque era também o dos demais e qualquer daqueles objetos faria o mesmo sentido para qualquer um de nós, já que todos eram apenas uma parte da mesma história, a todos nós igualmente familiar.

Acontece que toda história tem um lugar e um como começar. Não que houvéssemos esquecido como e onde começava a nossa, mas foi minha irmã Jamila, quem nos trouxe de volta ao princípio de tudo quando fez seu pedido:
_ Eu quero a mala de couro.
Maria, a esposa de papai foi buscar e trouxe a mala:
_ É esta aqui? Parecia não dar muita importância e não entender o significado que uma velha mala poderia ter...

Os mais jovens dentre nós nem sabiam a que ela se referia. Eu que por muitos anos vi aquela mala sobre o armário de papai, que a abri inúmeras vezes cheio de enorme curiosidade sobre ela, quase me havia esquecido dela até aquele momento.
E Jamila começou a explicar a todos a sua versão para a história daquela mala:
_ Esta mala me acompanha todos estes anos, por muitas noites sonhei com ela, dela tinha saudade imensa, ela sempre foi pra mim a personificação de meu pai.
Eu era bem pequenina, mas me lembro, com riqueza de detalhes; parece que estou vendo papai agora diante de mim no nosso sobrado em Bôca do Acre, vestido impecavelmente em seu terno de linho puro holandês, combinando as cores, do chapéu até as meias e o sapato, parecia um ator de cinema americano. Era assim que ele se vestia diariamente para trabalhar. Na mão a mala de couro marrom. Dentro dela, pensava eu, papai levava sua mercadoria – jóias que na minha imaginação davam para comprar toda Bôca do Acre...

Era a inofensiva arrogância manifesta dos Elmaleh, que sempre viram na figura de seu pai e todo o seu ramo ancestral, uma estirpe de “valorosos” – os “Valorosos Elmaleh de Boca do Acre”, e papai o senhor daquela Macondo.


David Salgado e parte de seus 8 irmãos, na festa de 97anos do primogênito Rubem.
Da direita para a esquerda: David, Anita, Rubem, Alegria e Jaime


terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Tu B´Shvat em Manaus


Tu B´Shvat em Manaus

No último dia 16 de janeiro, a comunidade judaica de Manaus  prestigiou a comemoração de Tu B’Shvat, Ano Novo das Árvores,  organizada pelo Comitê Israelita do Amazonas (CIAM).  O evento contou com o plantio de mudas na rua Rabino Jacob Azulay localizada na zona norte de Manaus. A região, antes toda coberta de vegetação primária da floresta amazônica, foi desmatada para a criação de um conjunto habitacional, ficando praticamente sem arborização urbana.


Fonte; Jornal Alef

sábado, 15 de janeiro de 2011

Tu b’Shvat

Por Rafael Stern*

A palavra “TU”, em Tu b’Shvat, é escrita em hebraico com as letras tet e vav, que correspondem, respectivamente, ao valor numérico de 9 e 6, somando 15.
Tu b’Shvat significa, portanto, 15 de Shvat, por ser esse o dia, no mês de Shvat em que se comemora o “Ano Novo das Árvores”.
Essa data não está explícita na Torá, mas na época do 2º templo. Era a data que dividia o ano em relação ao cálculo do dízimo sobre os frutos da plantação, segundo a lei judaica da época, na Terra de Israel.
Várias explicações estão relacionadas à escolha dessa data. O mês de Shvat é justamente o de transição entre o inverno e a primavera. O inverno é a estação chuvosa em Israel, e o que chove no inverno determina como será o resto do ano, em relação à vida das árvores silvestres e das plantações. Além disso, é nessa transição do inverno para a primavera que as sementes que estavam adormecidas no solo congelado começam a germinar,as árvores que perdem suas folhas na estação gelada com menos luz, começam a nascer novas folhas e a árvore que estava preservando energia, volta a crescer.
Durante os 2 mil anos de exílio judaico, os judeus não tinham costume de plantar árvores, pois não sabiam a duração de sua estadia em cada lugar, seja devido as expulsões ou fugas desesperadas de perseguições, ou mesmo da busca por outros lugares mais tolerantes ou com melhores condições de vida. O costume desenvolvido, então, para lembrar a data de Tu b’Shvat era o de comer frutos das sete espécies nativas, típicas da Terra de Israel. São elas: a Romã, a Uva, o Figo, o Trigo, a Cevada, a Azeitona e a Tâmara. Dessa forma, a ligação espiritual, geográfica e cultural com a Terra de Israel esteve sempre presente no âmago do povo judeu, e esse era um costume que demonstrava seu eterno desejo de retorno ao seu berço nacional, demonstrando como somente na Terra de Israel, o judaísmo poderia ser praticado e vivido de forma plena.
Com o retorno dos judeus à Terra e o reestabelecimento do Estado de Israel, o povo judeu voltou a plantar árvores e resgatou sua tradição agrícola através dos kibutzim e moshavim. Talvez pela privação acumulada de 2 mil anos, o amor pela terra e o anseio de vê-la florescendo,Israel, em 100 anos, passou do número de 5 milhões de árvores para 250 milhões, sendo o único país a entrar no século XXI com um saldo positivo de árvores.
No dia de Tu b’Shvat é costume plantar árvores pelo país inteiro. Novos bosques são criados, novas áreas verdes e nos kibutzim, todos os bebês nascidos desde o Tu b’Shvat passado ganham uma árvore em seu nome.
Este ano Tu b`Shvat acontece dia 20 de Janeiro e nós da comunidade de Manaus, estamos planejando um dia de plantio de mudas no domingo anterior, dia 16 de Janeiro. Pretendemos plantar mudas na rua Rabino Jacob Azulay, localizada no conjunto habitacional João Paulo II, na zona norte de Manaus. Já foi feito contato com os moradores que se mostraram muito Esse ano, Tu b’Shvat acontece no dia 20 de Janeiro. E nós, da comunidade judaica receptivos à idéia, já que a área de construção do conjunto foi drasticamente desmatada, onde antes era floresta amazônica intocada. Um ônibus deverá ser disponibilizado para ir e voltar, tendo como ponto de encontro a sinagoga.
Algumas referências das fontes judaicas à importância do plantio de árvores:
“’E quando vieres à terra e plantares árvore frutífera...’ (Vaikrá 19:23) D-s disse aos filhos de Israel: Ainda que a encontrares repleta de bens, não digas que permanecereis sentados sem plantar, senão que devereis ser prudentes com as plantações. Assim como chegardes e encontrardes as plantações de outros, também vós plantais para vossos filhos.” (Midrash Tanchuma, Parashat Kedoshim, capítulo 8).
“Desde a criação do mundo D-s não se ocupou inicialmente de outra coisa que não fossem as plantações, tal como se diz: ‘E plantou D-s um jardín no Éden’. Também vós, quando entreis na terra, não vos ocupeis inicialmente de outra coisa, senão das plantações. A isso se refere o versículo: ‘E quando vieres à terra e plantares…’” (Vaikrá Raba, 25).
“Rabi Simlai interpretou o seguinte: Por que razão Moshe Rabenu queria entrar na Terra de Israel? Acaso tinha que comer seus frutos, ou saciar-se de suas bondades? Moshe disse o seguinte: ‘Os filhos de Israel devem observar numerosos preceitos, que somente se cumprem na Terra de Israel’” (Sotá 14).
“Rabi Iochanan ben Zakai disse: Se estás plantando e te dizem: ‘Está chegando o Mashiach’ termina de plantar e somente depois vai recebê-lo (o Mashiach)” (Avot de Rabi Natan, capítulo 31).
“Pois o homem é uma árvore do campo”. (Devarim 20:19)

* Rafael Stern é sheliach de juventude da Comunidade de Manaus e o Representante(Peil)do Movimento Juvenil Sionista Habonim Dror na quelacidade.
Fonte:Nosso Jornal Rio – nº 71

"Vencendo leões..."

NUM TRIBUTO-RETRIBUIÇÃO À COMUNIDADE JUDAICA DA AMAZÔNIA.
 por Lucia de Olivera Mendana - (Ganhadora do Prêmio Samuel Benchimol, com o trabalho: ‘A Presença Judaica na Amazônia à Luz do Livre-Arbítrio’)
 
- ‘Você não imagina quantos leões teve de vencer para chegar aqui...’

David Salgado, diretor-fundador do Amazônia Judaica e Lucia de Oliveira Mendana, ganhadora do Prêmio Samuel Benchimol 2010, na categoria "200 Anos da Presença Judaica na Amazônia"
Eis o que eu ouvi de David Salgado, na noite de 18 de Novembro, quando fui recebida pela família Benchimol, no auditório da Biblioteca Samuel Benchimol, no prédio central da rede de Lojas Bemol, enquanto vivia a expectativa de ser aceita e acolhida pela ‘Mãe de Deus’, significado de Manaus – variação do termo ‘Manaós’ – representantes da raça indígena, que ocupavam o local onde a cidade foi erguida.

Aquelas palavras inesperadas foram ditas, depois de um desabafo repentino, meu, sobre os obstáculos seguidos, que eu havia experimentado, antes de seguir viagem, para receber o prêmio que me fora concedido pelo trabalho, de minha autoria, com foco no livre-arbítrio dos judeus que vieram para a Amazônia, há 200 anos, e que protagonizaram, com essa ‘escolha’, o início da formação da atual comunidade judaica.

... os leões foram muitos, mas você tinha que estar aqui, tinha de participar de tudo isso... – David disse depois, olhando à volta, com seu olhar sereno, como se suas palavras encerrassem uma ‘mensagem maior’, que eu deveria compreender. E, de fato, compreendi.

- Seu sobrenome é apenas ‘Oliveira’ ou ‘de Oliveira’? – ele me perguntou, em seguida, como se estivesse sendo levado pela própria percepção interior.

- ‘de Oliveira’ – eu respondi, de imediato, enquanto folheava o exemplar comemorativo da Revista ‘Amazônia Judaica’, que tinha acabado de receber dele. A mesma, aliás, que me inspirou, assim como as palavras que ele me dizia, a escrever o que está aqui.

- Então, use o seu nome judaico completo, como deve ser. – ele disse, de forma categórica, evidenciando o fato de que eu devia a mim mesma, e às minhas origens, fazer essa ‘opção justa’.

Tinha sido, sem dúvida uma noite gratificante, como poucas, capaz de me levar a dominar mais um leão: o pânico que sentia, a cada vez que precisava falar em público. A ocasião e os meus anfitriões, porém, mereciam que eu enfrentasse o que tanto temia, mas que precisava ser enfrentado. ‘Onde existe medo, falta fé. Não se pode servir a dois senhores. É preciso escolher entre ambos... – eu pensava, consciente do que havia aprendido e de que tinha de fazer a ‘escolha certa’: a de dar liberdade às palavras, me libertando através delas. A verdade é que há muito não me sentia tão bem, tão em casa, como se estivesse entre os meus. Davis Benzecry, Presidente do CIAM, foi outro grande responsável por isso, ao repetir em seu discurso, durante a solenidade de entrega do Prêmio, no dia 19, uma das argumentações sobre o livre-arbítrio, usadas por mim, no meu trabalho. Essa escolha, tão gentil, bem pode ter levado à reflexão sobre o fato de uma monografia ter sido agraciada entre trabalhos pertencentes a outras categorias, consideradas, por alguns, como sendo de maior valia. E, inclusive, à própria reflexão sobre a extrema importância de se ‘decidir valorizar’ – e não mais banalizar e discriminar – a contribuição do potencial judaico a este país. Eu me lembrei, então, de que os gêneros poesia e romance eram igualmente discriminados, mas não deixavam de persistir na Literatura, e fazer valer o seu valor. Assim como vinha fazendo o povo judaico, persistentemente, há anos.

A última noite, naquela terra em que eu pisava pela primeira vez, foi feita de descontração e simplicidade, na Hebraica, durante um jantar – feito de pratos e sabores marroquinos especialíssimos - em homenagem ao Embaixador de Israel Guiora Becher e a toda a Comitiva da CONIB, - entidade mater do judaísmo no Brasil -, presente na Convenção anual que estava sendo realizada, em solo manauara, pelos 200 anos da presença judaica nas terras amazônicas. Ao final, durante a apresentação de danças do ritual indígena, exibidas pelo eletrizante grupo regional ‘Andira’, pude ver que aqueles judeus, que haviam me recebido no seu meio, davam exemplos de sua própria união, ‘escolhendo dançar juntos’, como se, assim, unidos, lado a lado, promovessem um permanente e necessário encontro entre eles. Exatamente como acontecia ininterruptamente no ‘encontro das águas’, testemunhado por mim, depois que me deixei levar pelos segredos dos rios, para conhecer, de perto, a exuberante Natureza local, tão defendida por Samuel Benchimol e uma de minhas maiores paixões. Aquele fenômeno, a olhos vistos, não hesitava em dar lições de desprendimento e mútua cooperação, graças ao Negro e ao Solimões, que faziam rigorosamente a sua parte, até formar o Amazonas, o rio maior, que, por suas fabulosas características, bem merecia ser chamado de rio-mar.

Era justamente assim que aquele grupo hebraico se deixava levar, naquele palco, em meio à música, como se, dessa forma, revelasse a sua alma, numa espécie de celebração às suas origens, à sua crença, às suas vidas. E, muito particularmente, ao seu livre-arbítrio. Espectadora atenta, curiosamente eu me sentia liberta da timidez que me acompanhava desde criança, à vontade entre aqueles que me recebiam como se eu fosse um deles. Era como se - por influência de cada brasileiro-judeu, ali presente, e do meu sobrenome ‘de Oliveira’ - enfatizado por David Salgado - eu celebrasse, também, as minhas próprias raízes judaicas, firmes e profundas. Tanto quanto as raízes da imponente seringueira, - a árvore abençoada e provedora, que havia atraído, com sua valiosa matéria-prima, os jovens judeus marroquinos, a tomar a ‘decisão corajosa’ de se estabelecer no então desconhecido cenário amazônico, perseguindo seu direito humano de conquistar uma vida melhor.

Essa decisão, nada fácil, tornou possível a existência de Samuel Benchimol, e dos seus, de cada um daqueles, enfim, que surgiam como produtos dos seus ancestrais. Todos eles, significando ‘gente que sabia fazer diferença como gente’. E, apenas isso, era o que mais importava.

Só me resta agradecer por tudo que Benchimol me inspirou e proporcionou. Como profissional e, muito especialmente, como o ser humano que ele ‘escolheu ser’.

- Continue a fazer coisas boas e você vai ganhar muito mais... – afirmou Ilko Minev, em resposta ao meu reconhecimento pelo muito que eles me haviam me dado, em tão pouco tempo, observado pelos olhos azuis e profundos de Nora, sua maior parceira, e uma das maiores conquistas do Professor Benchimol, assim como o seu irmão, Jaime. As palavras dele – ditas de forma espontânea, sincera, pareciam soar como retribuição à espontaneidade e sinceridade, sentidas e usadas por mim, em cada palavra do trabalho que eu criara. Pareciam, no entanto, conter algo mais: uma espécie de retratação da vida, a mim, que vinha, há tempos, tentando ‘vencer leões ferozes, ameaçadores’, em forma de obstáculos e mais obstáculos. Todos eles, certamente ‘transponíveis’ - ou, ao menos, contornáveis -, se cada um de nós - judeu ou não - ‘escolhesse ter em mente que fora criado à imagem e semelhança da perfeição divina, que, em si mesma, encerrava a esperança de obter a vitória, a partir da decisão de ‘ser, ousar, fazer’. Nos moldes da razão, mas sem jamais perder de vista a emoção e o conceito de humanismo. Sem qualquer espaço, enfim, para discriminações ou preconceitos inaceitáveis. O prêmio que eu havia recebido comprovava essas verdades. Afinal, ele representava uma conquista, que esvaziava de poder, um a um, os leões, imaginários ou não, que vinham me cercando. Só lamentava não poder ser abraçada por meu pai, jornalista e advogado defensor dos direitos humanos, e pelo próprio Samuel Benchimol, defensor maior dos direitos ambientais, que haviam se ausentado daqui, depois de cumprir, com mérito, o ‘tempo de vida de sua comunicação’. Esse tempo valioso, concedido a cada um de nós, para dizer o que precisa ser dito. Fazer o que precisa ser feito. Mais e melhor até do que esperam de nós.

Definitivamente, seria impossível esquecer essa experiência tão rica, em tudo e por tudo, judaica. As palavras de Benchimol vieram, então, à minha mente:
- ‘Se mais não fiz para esta Amazônia, ‘Um Pouco-Antes e Além-Depois’, terá sido por falta de suficiente engenho e arte, devido às minhas limitações acadêmicas e profissionais’. Samuel Benchimol (Manaus 1924 - 2002).

Tendo ‘escolhido ser eterna aprendiz desse homem inspirador’, e de seu conhecimento, eu ouso repetir as palavras dele, à minha maneira:

- Se mais não fiz, no trabalho que criei, foi por não ter presenciado, antes, ao vivo, o livre-arbítrio judeu, em toda a sua expressão e dimensão, como tive a oportunidade de fazer, graças à família Benchimol, e ao Prêmio que recebi, e que compartilho, aqui, agora, com cada família judaica da Amazônia, que vem deixando suas marcas nessas terras, enfrentando os seus próprios leões, o que exige a escolha abnegada de ‘usar a fé’, ‘acreditar em si mesmo e no próprio poder interior’.

A todos vocês, portanto, a minha admiração, e o meu mais sincero e fraterno ‘Mazel Tov’!